Esquema de aula
Críticos da Sociedade Moderna
Aprendemos que a Sociologia pode ser entendida como uma reação à sociedade moderna. Em primeiro lugar ela é uma reação porque alguns intelectuais se esforçaram por caracterizar e explicar o novo tipo de sociedade que tinha surgido da decadência da sociedade tradicional (agrária). Assim, a Sociologia surge para explicar a nova realidade social.
Porém, a Sociologia também pode ser vista como uma reação à sociedade moderna uma vez que os cientistas sociais do final do século XIX e início do XX se imbuíram de que a nova ciência também deveria contribuir para melhorar a sociedade existente. E isso implicava em criticar o que consideraram o principal ou os principais problemas criados pela realidade social.
Convém lembrar que a Sociologia não criou a crítica social. Na tradição ocidental até mesmo os profetas bíblicos podem ser considerados precursores da tradição crítica. Grosso modo, o que caracteriza a crítica social anterior ao surgimento da Sociologia é o seu caráter moral. O que esta nova ciência trouxe de novo à tradição crítica foi a sociologização da crítica social. Em termos bem simples isso quer dizer que os problemas sociais (objeto da crítica) têm causas sociais.
Os três principais sociólogos desse período , em maior ou menor grau, teceram críticas à nova realidade. Durkheim constatava que na sociedade moderna (industrial) a consciência coletiva (as crenças e respeito às normas que criavam um forte sentimento de comunidade) perdia força com o avanço da modernidade. Ele não via isso com bons olhos. Temia que isso levasse a sociedade a uma atomização; uma realidade na qual seriam bem fraco os nossos vínculos com os demais membros da sociedade. Ele não era pessimista, pois achava que a divisão do trabalho e outras instituições reconstruiriam esses vínculos em novas bases.
Weber era pessimista. Ele considerava a sociedade moderna como superior às que até então existiram. Porém, para ele a exaltação da razão (racionalidade instrumental) típica da modernidade acabaria criando uma realidade que reduziriam drasticamente o espaço para a espontaneidade e para a liberdade. Por isso , de forma pessimista, vê a nova realidade como uma gaiola de ferro, ou seja, algo que suprime a liberdade.
Marx, sem dúvida, foi o que teceu as críticas mais contundentes à sociedade moderna. Embora ele não utilize este termo e prefira denominar a nova realidade social pela suas relações econômicas, ou seja, sociedade capitalista.
Pela importância política e acadêmica que as ideias de Marx tiveram e, de certa forma, ainda têm, vamos nos concentrar apenas nesse crítico da sociedade moderna.
A importância política das ideias de Marx
Para ele, a sociedade capitalista
estrutura-se sobre o conflito de
classes.
Para Marx a sociedade capitalista
deve ser criticada porque
a) produz a alienação
b) está baseada na exploração
c) Está baseada na opressão
d) Se reproduz criando falsa consciência (ideologia)
A solução de todos esses problemas, para Marx, viria da destruição (revolução) da sociedade capitalista. Isso aconteceria como resultado da luta de classes. A classe explorada premida pelas suas péssimas condições de vida (pauperização) tomaria consciência da situação de desumanização a que estava submetida e faria uma revolução. A partir dessa revolução seria construída uma sociedade comunista.
Atividades
Abaixo você lerá trechos do capítulo: Mudanças na Estrutura das Sociedades Industriais a partir de Marx. Ele é o segundo capítulo do livro As Classes e os seus Conflitos na Sociedade Industrial, Ralf Dahrendorf, Brasília, Editora da Universidade de Brasília/Fundação Roberto Marinho, 1978.
Neste capítulo, Dahrendorf comenta
criticamente algumas previsões que Karl Marx fez sobre o futuro da sociedade
capitalista. Karl Marx foi um pensador que viveu e produziu intelectualmente no
século XIX e fez uma volumosa e bastante elogiada análise do funcionamento da
economia e da sociedade capitalista. Para Marx, a estrutura econômica da
sociedade determina a estrutura social, política e cultural da sociedade.
Baseado no estado do capitalismo no século XIX, Marx fez algumas previsões
sobre o futuro da sociedade capitalista. Dahrendorf não nega o valor das
análises de Marx. Para ele, suas análises foram excelentes, mas restringem-se à
sociedade capitalista do século XIX. Embora baseada em tendências, as previsões
de Marx, segundo Dahrendorf, não se realizaram.
Ralf Dahrendorf ( 1929/2009) foi um sociólogo com inúmeros livros publicados em diversos idiomas. Ele foi diretor da LSE (London School of Economic and Political Science) no período 1979/89 e foi decano numa das faculdades que compõem a Universidade de Oxford.
1. Sobre a situação dos
trabalhadores
“ Marx foi um autêntico pensador
do século XIX ao tentar derivar a sua previsão a respeito da crescente
homogeneidade do operariado a partir da premissa de que o desenvolvimento
técnico da indústria tenderia a abolir todas as diferenças de especialização e
qualificação .....Marx adotou tranquilamente esta posição que se adaptava tão
bem a suas teorias gerais da estrutura de classes sociais . Para ele ‘ Os
interesses e as situações de vida do proletariado uniformizam-se cada vez mais,
uma vez que a maquinaria extingue progressivamente as diferenças do trabalho e
deprime o salário praticamente em todos os lugares, a um nível igualmente
baixo’ “
“Na verdade, tanto quanto se pode
afirmar com base nos elementos disponíveis, até o fim do século XIX prevaleceu
a tendência `a não especialização da maior parte dos trabalhadores industriais;
isto é a sua redução a um mesmo nível baixo de qualificação…”
(....)
“Neste caso como em outros, Marx
estava evidentemente enganado. ‘Em todos os lugares a classe trabalhadora se
diferencia cada vez mais, por um lado, em grupos ocupacionais e, por outro
lado, em três grandes categorias com interesses diferentes, quando não
contraditórios: os artífices especializados, os trabalhadores não
especializados e os operários semiespecializados “
“.... O proletário, o escravo
pauperizado da indústria indiferenciável dos seus companheiros em termos de
trabalho, competência, salário e prestígio, desapareceu da cena “
Questão No primeiro
parágrafo, Marx afirma que a classe operária sofreria dois processos de
homogeneização.
1.1. Qual o primeiro processo de homogeneização
apontado por Marx?
1.2. Qual o segundo processo de
homogeneização apontado por Marx?
1.3. O que causaria estes dois
processos?
2. Sobre a classe média
Para Marx a classe média tendia a
desaparecer. Lembre-se que ele morreu em 1883 e, portanto, estava falando da
realidade que lhe era familiar. A classe média do tempo de Marx era basicamente
composta por pequenos proprietários rurais e pequenos comerciantes e, por isso,
ele a chama de pequena burguesia. A seu ver a concentração capitalista, ou
seja, o processo no qual os grandes capitalistas levam os menores á falência ou
compram as suas empresas, levaria a uma redução do tamanho da classe média.
Evidentemente que tendo o seu tamanho reduzido, ela não teria forças para
interferir na dinâmica da política.
Dahrendorf, que escreveu quase cem
anos depois de Marx, viu outra realidade social. Para ele, a classe média, ao
contrário de ficar reduzida, cresceu gigantescamente e adquiriu uma importância
política desproporcional ao seu tamanho.
2.1. Marx estava correto ao
afirmar que a concentração do capital é uma tendência inexorável na dinâmica do
sistema capitalista? Fundamente a sua resposta. Lembre-se de organizar uma
frase que fique claro a sua tese (se Marx estava certo ou errado nesse ponto)
2.2. Leia a frase abaixo e diga se
você concorda ou discorda dela. Não esqueça que você deve fundamentar a sua
opção.
Ao contrário do que Marx
imaginava, a concentração capitalista destrói pequenos negócios, mas, ao mesmo
tempo, cria oportunidade para o surgimento de outros negócios.
3. Sobre a mobilidade social
“ ... Mas, para Marx, a mobilidade
social era um sintoma de períodos transitórios e efêmeros da história, isto é ,
sintomas do surgimento ou do colapso iminente de uma sociedade. Hoje
tenderíamos a tomar uma posição oposta. A mobilidade social tornou-se um dos
elementos cruciais da estrutura da sociedade industrial a tal ponto que
estaríamos tentados a prever o seu colapso caso o processo de mobilidade fosse
seriamente frustrado, estorvado do surgimento ou do colapso “
(....)
“...Quando Marx escreveu a sua
obra supôs que a posição ocupada por um indivíduo na sociedade é determinada
pela origem da sua família e pela posição social dos seus pais. Os filhos de
operários não têm outra escolha a não senão tornar-se eles próprios operários,
e os filhos dos capitalistas permanecem na classe dos seus pais. Em sua época, provavelmente,
esta suposição não se afastava muito da verdade. Mas, a partir de então, um
novo modelo de alocação de papéis institucionalizou-se nas sociedades industriais.
Hoje a alocação das posições sociais é, cada vez mais, tarefa do sistema
educacional. .... A mobilidade social que, para Marx, era a exceção que
confirmava a regra do fechamento das classes, transformou-se em uma estrutura
das sociedades industriais ...“
Questão 3.1. Qual a tese de Marx sobre a mobilidade social na sociedade capitalista.
Questão. 3.2 Qual é a tese de Dahrendorf sobre a mobilidade social na sociedade
capitalista.
Questão. 3.3. Qual seria o
principal fator de mobilidade social nas sociedades capitalistas?
4. Sobre a igualdade. ATENÇÃO. O texto abaixo tem um grau de dificuldade maior. O aluno precisa saber distinguir as partes do texto nas quais Dahrendorf expressa o que Marx teria dito sobre um determinado tema e as partes em que expõe a sua ideia sobre este mesmo tema.
“Com efeito, Marx empregou seu
estilo mais debochado e cínico ao referir-se à igualdade perante a lei na
sociedade capitalista: ‘ Liberdade! Pois os compradores e vendedores de um bem,
por exemplo, a força de trabalho, são determinados exclusivamente por sua livre
vontade. Eles estabelecem contratos como pessoas livres e legalmente
iguais...Igualdade! Pois eles se relacionam apenas como possuidores de bens e
trocam equivalentes por equivalentes. Propriedade! Pois cada pessoa controla
apenas o que é seu. ’ . Mas Marx esqueceu do que Tocqueville (cuja obra
provavelmente ele conhecia) já havia observado antes dele, ou seja, que a
igualdade é uma força altamente dinâmica e que se os homens são iguais em
algumas áreas ‘devem, afinal, ser iguais em todas elas ‘ “
“Um passo considerável em direção
à igualdade completa foi dado no século XIX, quando os direitos do cidadão
foram estendidos à esfera política. O sufrágio universal e o direito à formação
de partidos e associações políticas envolveram a remoção dos conflitos
políticos das fábricas e das ruas para os órgãos de negociação e os parlamentos.
Em um nível diferente, isso abriu a possibilidade de que os seguidores de Marx
convertessem as teorias do seu mestre em realidades políticas – mas que também
fez com que elas fracassassem nesse processo tão miseravelmente quanto o
próprio Marx. Em virtude da liberdade de associação e da igualdade política, o
movimento sindicalista original, assim como os partidos socialistas dele derivados,
obtiveram êxito considerável em melhorar a sorte da classe trabalhadora ,
embora este progresso fosse restringido por muitos obstáculos..... Somente no
nosso século (o século XX) , quando os direitos legais e políticos do cidadão
foram suplementados por certos direitos sociais , o processo de equalização do status
alcançou realmente o ponto em que as diferenças e os antagonismos de classe
foram atingidos “
.... “Se a igualdade perante a lei
era apenas uma ficção cínica para a maior parte das pessoas nas primeiras fases
da sociedade capitalista, os amplos direitos do cidadão na sociedade industrial
representam uma realidade em que neutraliza forçosamente todas as formas
remanescentes de desigualdade e diferenciação sociais “
5. Sobre o
conflito de classes.
“ Marx revelou certa ingenuidade
sociológica ao expressar sua crença em que a sociedade capitalista seria
inteiramente incapaz de lidar com o conflito de classes gerado por sua
estrutura de classes (capitalistas X operários). Na verdade, todas as
sociedades são capazes de enfrentar quaisquer novos fenômenos surgidos em seus
seio, pelo menos pela inércia, simples , mas efetiva, que pode ser descrita ,
um pouco pretensiosamente , como o processo de institucionalização. No caso dos
conflitos de classe, a institucionalização assumiu numerosas formas sucessivas
e complementares. Teve início com o penoso processo de reconhecimento das
partes disputantes como legítimos grupos de interesse. Dentro da indústria, um
sistema secundário de cidadania industrial tornou possível tanto aos operários
quanto aos empresários defender coletivamente os seus interesses. Fora da indústria,
o sistema primário de cidadania política teve o mesmo efeito . E, se , no
estágio de organização , o conflito pode desenvolver um intensidade
visivelmente maior , a organização produz , pelo menos dois efeitos colaterais
que operam em sentido contrário. A organização (dos interesses em conflito)
pressupõe a legitimidade dos grupos em conflito e com isso remove a ameaça
permanente e incalculável do conflito violento, intenso e altamente destrutivo,
cuja expressão mais radical é a luta armada. Ao mesmo tempo, torna possível a
regulação sistemática dos conflitos. Organização é institucionalização, e,
enquanto a sua função manifesta é a defesa e cada vez mais articulada e
veemente dos interesses dos diferentes grupos, ela também tem, invariavelmente,
a função latente de estabelecer procedimentos de conflito que contribuem para
reduzir a violência dos choques de interesse”
“Estas são generalizações
derivadas da experiência dos conflitos de classe nas sociedades capitalistas e
industriais. Neste caso, a organização do capital e do trabalho, da burguesia e
do operariado, foi logo seguida por diversos modelos posteriores de
regulamentação dos conflitos. Por um lado, as partes disputantes na indústria e
na política puseram-se de acordo quanto às regras do jogo e criaram
instituições que proporcionaram um arcabouço para a normalização do processo do
conflito. Na indústria elas incluem órgãos de negociação coletiva de diversos
tipos e os tribunais desempenham funções similares. Todas estas formas ajudam a
transformar as greves e guerras civis das armas que antes eram a forma natural
de expressão dos conflitos em recurso final para estes mesmos conflitos. “
“Marx foi tão sensibilizado pela
dinâmica dos primeiros conflitos industriais que acreditou ser totalmente
impossível sua resolução satisfatória a não ser através de uma revolução. No
entanto, como muitos dos seus contemporâneos Marx se enganou …. Ao invés de um
campo de batalha, o cenário do conflito de grupos tornou-se uma espécie de
mercado em que forças relativamente autônomas confrontam-se de acordo com
certas regras do jogo em virtude das quais ninguém é permanentemente vencedor
ou perdedor. Naturalmente, este curso de desenvolvimento deve ser amargo para
os marxistas ortodoxos ....mas o seu amargor é do tipo que faz sorrir os
liberais “
Questão 5.1. Qual a previsão que
Marx fez em relação ao conflito de classes na sociedade capitalista?
Questão 5.2. O que, segundo
Dahrendorf, efetivamente aconteceu com o conflito de classes nas sociedades industriais?